Breve resumo

Para se entender, Elio busca conhecimento. Lê sobre filosofia, psicologia, observa as pessoas, faz cursos diferentes. Cada novo aprendizado é uma ferramenta que o ajuda a desmontar e remontar sua visão de mundo.

Elio percebeu então o equívoco. Não sabia quase nada, afinal, não é por que sabia programação que poderia codificar o conhecimento humano, ou a filosofia, a psicologia, a sociologia, a própria espiritualidade. Em suma, as matérias humanas que são potenciais para que ele obtivesse autoconhecimento, ou um conhecimento mais abstrato e um pouco diferente daquelas lógicas de programação que aprendera tão bem.

Matriculou-se em um curso de psicologia do comportamento, porque ele prometia mostrar a lógica (muitas vezes ilógica) que não raro mostrava uma rota diferente da habitual em comportamentos tipológicos de caráter. Seria uma ferramenta a mais no seu objetivo, que era se ‘graduar’ no seu despertar para a luminosidade do saber. Vivia agora um novo mundo, um novo momento na vida, e todos os conhecimentos que pudessem alargar sua visão de mundo eram muito bem vindos.

A humildade foi o primeiro e mais doloroso módulo desse novo curso. Elio, acostumado a dominar linguagens de programação em semanas, se via agora diante de conceitos que se recusavam a ser compilados. Palavras como “inconsciente coletivo”, “arquétipo” ou “dissonância cognitiva” não tinham manuais de instrução claros. Eram como códigos-fonte escritos em uma linguagem antiga e poética, onde um ponto e vírgula fora do lugar não quebrava o programa, mas abria um novo universo de interpretação.

Sua mente lógica, outrora sua maior aliada, tornou-se sua maior adversária. Ele lia sobre a sombra de Jung e sua primeira reação era buscar a definição no dicionário, tentar categorizar, criar um diagrama de fluxo. Mas a sombra escapulia, rindo baixo de suas tentativas de aprisioná-la em algoritmos. Era como tentar pegar fumaça com as mãos.

A frustração era um fantasma familiar que voltou a assombrá-lo. Mas algo era diferente. Antes, a frustração o paralisava. Agora, ela o impulsionava. Cada conceito que ele não entendia de imediato era um bug fascinante, um desafio que merecia horas de estudo, não de desespero. Ele sublinhava livros de filosofia até a madrugada, anotava termos à margem, criava mapas mentais que mais pareciam teias de aranha de um louco – conexões tênues e brilhantes entre Platão e um post de blog sobre neurociência.

O curso de psicologia do comportamento foi uma revelação. Era o ponto de intersecção perfeito entre seu mundo antigo e o novo. Ali, a “lógica ilógica” da mente humana era dissecada, não em juízos de valor, mas em padrões observáveis. Ele via seus próprios mecanismos de defesa descritos com frieza clínica nas páginas dos livros. Reconhecia a si mesmo nos experimentos sobre viés de confirmação e na teoria da autodeterminação. Era assustador e libertador. Assustador porque via que muito do que considerava “eu” era, na verdade, um programa biossocial rodando em loop. Libertador porque, ao entender o programa, ele ganhava o poder de reescrevê-lo.

Cada novo aprendizado era uma ferramenta que ele adicionava ao seu cinto de utilidades. A filosofia estoica lhe deu a chave inglesa para lidar com a ansiedade. A psicologia analítica de Jung lhe deu um mapa para navegar seus devaneios. A sociologia lhe mostrou que muitas de suas correntes internas eram marés influenciadas pela lua da cultura.

Ele não estava mais se perdendo em fantasias. Estava mapeando seu território interior. A “luminosidade do saber” não era um holofote que revelava tudo de uma vez. Era como acender uma lanterna em uma caverna escura: iluminava um pedaço de cada vez, mostrando belezas e perigos, estalactites de insight e poços de dúvida ainda mais profundos.

O mundo, outrora um lugar plano e previsível, agora tinha camadas, texturas, profundidade. Ele olhava para uma pessoa na rua e não via mais um estranho, mas um universo de complexidades semelhantes às suas, lutando suas próprias batalhas silenciosas.

Elio não havia encontrado as respostas. Mas havia encontrado algo mais valioso: as perguntas certas. E, o mais importante, havia aprendido a amar o processo de buscá-las. A sede do saber, ele descobriu, não é saciada pela água da resposta final, mas pelo próprio ato de beber da fonte do questionamento.


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